Ozonioterapia como Tratamento para a Osteonecrose dos Maxilares associada ao uso de bifosfonatos
Os bifosfonatos (BFs) são uma classe de medicamentos que previnem a reabsorção e a diminuição da densidade mineral óssea. Esses fármacos são amplamente utilizados para o tratamento de patologias como mieloma múltiplo, metástase óssea de câncer de mama e próstata, hipercalcemia maligna e doença de Paget. Além disso, representam a primeira escolha para a prevenção secundária e tratamento da osteoporose. Alendronato, pamidronato, clodronato e ácido zoledrônico, são exemplos de bifosfonatos aprovados para uso pela ANVISA.
O mecanismo de ação dos bifosfonatos está associado com a atividade antiosteoclástica e antiangiogênica. No entanto, relatos da literatura internacional mostraram uma associação entre essa terapia e a necrose avascular dos maxilares, principalmente quando estes medicamentos são administrados de forma intravenosa. A meia-vida plasmática dos BFs é de aproximadamente 10 anos, ou seja o seu uso prolongado pode resultar em acúmulo substancial da droga no esqueleto, desta forma a suspensão do medicamento antes de cirurgias, por exemplo, não é eficaz pois este fármaco permanece no nosso organismo por muitos anos.
As lesões de Osteonecrose dos maxilares podem permanecer silenciosas até a ocorrência de eventos como traumatismos orais, seja por próteses mal adaptadas ou procedimentos cirúrgicos orais, que podem expor o osso à colonização bacteriana da cavidade bucal. As manifestações clínicas podem variar de inchaços simples de tecidos moles a abscessos, exposição óssea, apresentando fístulas, sequestros ósseos, fraturas patológicas e dor intensa.
Nos últimos anos, inúmeros estudos avaliam protocolos de tratamento, médicos e cirúrgicos, para o manejo da Osteonecrose dos maxilares associada ao uso de bifosfonatos. Geralmente a terapia se baseia em tratamento médico, antibiótico e antimicótico, juntamente com cirurgia minimamente invasiva para remoção de sequestros ósseos e curetagem.
Desta forma, o ozônio pode se constituir como uma terapia de suporte ou terapia de escolha para casos de pacientes previamente tratados com vários antibióticos sem resposta adequada.
O estudo de Ripamonti et al. (2012) publicado na Journal of Bone Oncology na Holanda avaliou a eficácia e tolerabilidade do tratamento com ozônio medicinal (O3) em lesões de Osteonecrose associada ao uso de bifosfonatos (lesões com mais de 2,5 cm de diâmetro). Foram incluídos no estudo vinte e quatro pacientes (idade média de 62,5 anos, 12 mulheres) com lesões de Osteonecrose associada ao uso de ácido zoledrônico (bifosfonato) para o tratamento de metástases ósseas devido a câncer ou osteoporose.
Estes pacientes foram tratados com insuflação tópica de gás O3 a cada três dias durante um mínimo de 10 sessões para cada área patológica ou até atingir a expulsão espontânea do sequestro ósseo necrótico. Para isto, foi utilizado um dispositivo especial de insuflação em forma de sino ajustado às características específicas da arcada do paciente, capaz de eliminar qualquer resíduo da difusão de O3, degradando-o e liberando O2 no ar.
Os resultados obtidos foram que seis pacientes apresentaram sequestro e expulsão espontânea completa ou parcial (um paciente) do osso necrótico, seguida de reepitelização da mucosa oral após um intervalo de 4-27 de insuflações de gás O3. Nenhum paciente relatou eventos adversos. Em 12 pacientes com as maiores e mais profundas lesões da Osteonecrose, a gasoterapia com O3 produziu o sequestro do osso necrótico após 10 a 38 insuflações; foi necessária cirurgia para removê-lo (11 pacientes). Em todos os pacientes tratados com gás O3 não houve recidiva das lesões de Osteonecrose (média de seguimento de 18 meses, intervalo de 1 a 3 anos). Os autores concluíram que as insuflações de gás O3 são um tratamento eficaz e seguro para pacientes tratados com bifosfonatos que desenvolveram lesões de osteonecrose.
Portanto, pode se observar que esta melhora no quadro clínico não se deve a apenas à ativação de fibroblastos, ativação do sistema imunológico e neoangiogênese (formação de novos vasos sanguíneos), mas também ao efeito bactericida do ozônio contra bactérias frequentes no meio oral como Staphyloccoccus aureus.
Outro estudo de Ripamonti et al. (2011) publicado na Oral Oncology na Inglaterra, avaliou o tratamento destas lesões com óleo ozonizado. Para a metodologia foram incluídos 10 pacientes com lesões de osteonecrose associada ao uso de BFs (lesões com diâmetro inferior a 2,5cm) que não responderam ao tratamento conservador.
A terapia consistiu na administração prévia de antibióticos (Azitromicina, 500 mg / dia durante 10 dias), limpeza da lesão óssea exposta e a borda osteomucosa com um raspador ultrassônico, e 10 aplicações locais de óleo ozonizado por 10 minutos. Os resultados foram ainda mais promissores, visto que em todos os pacientes, as lesões das mucosas foram resolvidas com reconstituição completa do tecido bucal e mandibular, com 3-10 aplicações. Também foi observado sequestro total do osso necrótico, com expulsão espontânea em oito pacientes e nova formação óssea ao redor da área necrótica em dois pacientes. Nenhum paciente necessitou de intervenção cirúrgica e em dois pacientes com radiografias pré e pós-tratamento, não foram observadas lesões ósseas residuais. Além disso, nenhuma toxicidade foi relatada.
Em relação à utilização da água ozonizada, o estudo de Brozoski et al. (2014) também mostra resultados favoráveis. O tratamento incluiu enxagues bucais diários e irrigações intra-orais semanais com 4mg /L de ozônio aquoso, antibioticoterapia e debridamento superficial seguido de remoção cirúrgica de sequestros ósseos. Os resultados a partir de avaliação intra-oral e radiografias panorâmicas do osso afetado mostraram cobertura mucosa completa da área óssea exposta e resolução da secreção purulenta. Os autores também verificaram que os enxagues bucais diários com água ozonizada e irrigação semanal profissional foram seguros, livre de efeitos adversos, de fácil manuseio e funcionaram como uma importante estratégia terapêutica adjuvante para o tratamento destas lesões.
Relatos na literatura ainda citam a utilização de outras vias de administração do ozônio como potenciais auxiliares na terapêutica da Osteonecrose associada ao uso de BFs, como por exemplo a auto-hemoterapia e insuflação retal, visando desta forma estimular e fortalecer a resposta imunológica destes pacientes, que normalmente já foram submetidos a inúmeros tratamentos medicamentosos.
Assim, pode-se concluir que o ozônio administrado nas mais variadas formas deve ser considerado uma opção terapêutica promissora, eficaz, segura e simples para o tratamento de lesões de Osteonecrose associada ao uso de bifosfonatos.
REFERÊNCIAS
BROZOSKI, M. et al. Adjuvant aqueous ozone in the treatment of bisphosphonate induced necrosis of the jaws: Report of two cases and long-term follow-up. Minerva Stomatol., Torino, v. 63, n.1-2, p.35-41,2014.
RIPAMONTI, C. I. et al. Efficacy and safety of medical ozone (O3) delivered in oil suspension applications for the treatment of osteonecrosis of the jaw in patients with bone metastases treated with bisphosphonates: Preliminary results of a phase I–II study. Oral Oncol., Oxford, v.47, n.3, p.185-190, 2011.
RIPAMONTI, C. I. et al. Efficacy and tolerability of medical ozone gas insufflations in patients with osteonecrosis of the jaw treated with bisphosphonates—Preliminary data. J Bone Oncol, Amsterdam, v.1, n.3, p.81-87, 2012.
Imagem do estudo de Ripamonti et al. (2011) – Desde o início da terapia com óleo ozonizado até a remoção completa do sequestro ósseo e a reepitelização. Relato um caso clínico em diferentes momentos T0 no diagnóstico de osteonecrose associada ao uso de bifosfonatos, antes do início da terapia(A), até o momento da cicatrização completa da ferida com reepitelização da mucosa oral (F).
Este paciente apresentou-se em T0 com lesão osteonecrótica de 11,09×8,5 mm (A). Conforme protocolo, o paciente foi pré-tratado por 10 dias com antibióticos (Azitromicina, 500 mg / dia) e, em seguida, com quatro aplicações de óleo medicinal de O3. O sequestro ósseo osteonecrótico foi facilmente removido pelo dentista com pinça anatômica, sem dor ou sangramento (D). O tecido mucoso abaixo do sequestro ósseo foi completamente curado e reepitelizado com tecido epitelial regenerado (E-F). O exame patológico da amostra de osso necrótico confirmou a evidência clínica de necrose.